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  • Foto do escritorAndré Pacheco

Restos Mortais de Antepassado dos Gatos Domésticos Encontrados em Grutas na Polônia

A descoberta de restos mortais com 7 mil anos de idade de um gato selvagem do Oriente Próximo na Europa adiciona novos contornos à história evolutiva deste animal.



O gato selvagem europeu (como este fotografado no Parco Natura Viva, em Itália) partilhou o habitat com o gato selvagem do Oriente Próximo, na Polónia, há 7 mil anos. FOTOGRAFIA DE JOEL SATORE, NATIONAL GEOGRAPHIC PHOTO ARK



Quando os primeiros agricultores neolíticos partiram do Crescente Fértil, há cerca de 7 mil anos, levaram consigo animais recém-domesticados, como cabras, ovelhas, gado e cães. Mas provavelmente não perceberam que um animal esquivo, o gato-selvagem do Oriente Próximo, também seguia à boleia com eles. Quando os migrantes chegaram à Polónia há cerca de 6 mil anos e começaram a converter as florestas em campos abertos de pasto e campos agrícolas, os roedores e os gatos selvagens – um antepassado dos nossos gatos domésticos – também se estabeleceram. Esta é a conclusão de um novo estudo que encontrou os primeiros restos esqueléticos de que há conhecimento de gatos selvagens do Oriente Próximo em quatro cavernas na Polónia, perto de algumas das primeiras povoações agrícolas primitivas. “Foi tão inesperado”, diz Magdalena Krajcarz, chefe do estudo e arqueozoóloga da Universidade Nicolaus Copernicus, em Torun, na Polónia. Uma descoberta notável foi o úmero de um gato – um osso longo da perna – incorporado numa camada de sedimentos com vasos de cerâmica.


Não se sabe se o gato teve algum tipo de relação com humanos, diz Krajcarz – os povos neolíticos visitavam ocasionalmente as cavernas, mas o osso também pode ter sido levado por um predador. Mas a presença deste felino sugere que a sua companhia era agradável – um passo importante no percurso para se tornar completamente domesticado, diz Krajcarz.

Todos os gatos domésticos da atualidade são descendentes do gato selvagem do Oriente Próximo, que foi domesticado nessa região há cerca de 10 mil anos. Agora, a descoberta deste gato na Europa pode acrescentar novos contornos à sua história, de acordo com o artigo publicado no dia 13 de julho na Proceedings of the National Academy of Sciences.

Por exemplo, os cientistas também desenterraram ossos de quatro gatos selvagens europeus, um parente nativo do gato selvagem do Oriente Próximo, nas mesmas cavernas. Isto significa que os gatos selvagens do Oriente Próximo podem ter encontrado um parente distante quando chegaram ao seu novo lar (as duas espécies partilharam o último antepassado comum há cerca de 200 mil anos).

Isto levanta muitas questões intrigantes, diz Krajcarz, como por exemplo saber se os dois felinos competiam entre si por presas ou até mesmo se hibridizaram. Nesse caso, isso poderia significar que os nossos gatos de estimação têm um passado evolutivo mais complexo do que imaginávamos.


Indícios nos ossos

Para descobrir mais sobre a relação entre ambos os gatos, os cientistas investigaram o que os animais comiam através da análise de isótopos – ou as diferentes formas químicas – de nitrogénio nos ossos dos gatos.

Outros estudos já demonstraram que os povos neolíticos usavam esterco para fertilizar as suas colheitas; isto é representado por um sinal elevado de nitrogénio nos ossos dessas pessoas e nos ossos dos seus cães e animais. Porém, os gatos selvagens do Oriente Próximo tinham uma concentração mais baixa de nitrogénio nos seus ossos, um sinal de que estes “gatos tinham uma relação afastada com os humanos” e certamente não dependiam das pessoas para se alimentarem, diz por email Claudio Ottoni, paleogeneticista da Universidade Sapienza de Roma.

Os gatos provavelmente comiam roedores que viviam nos campos dos agricultores, possivelmente incluindo os ratos-domésticos do Oriente Próximo, bem como as espécies nativas locais, como ratazanas e ratos-do-campo.

A análise feita aos ossos dos gatos selvagens europeus revelou um padrão semelhante, o que significa que também comiam roedores nos campos e celeiros dos agricultores. Mas a análise também mostrou que os gatos selvagens europeus mudaram a sua dieta – abandonaram as pequenas criaturas florestais para comerem aves migratórias selvagens (como turdídeos), que provavelmente eram atraídas pelos novos campos agrícolas abertos.

“Portanto, os dois gatos selvagens não competiram diretamente”, diz Krajcarz. “Eles podem ter coexistido” neste novo habitat e muito provavelmente hibridizaram. Os futuros estudos genéticos podem revelar a extensão da hibridização – e se a adição dos genes destes gatos selvagens europeus afetou a forma como o gato selvagem do Oriente Próximo evoluiu para o gato doméstico.

Por exemplo, os genes europeus podem ter impedido que os gatos do Oriente Próximo se tornassem completamente domesticados nesta parte da Europa durante um longo período de tempo. Isso faria sentido, já que os ossos dos gatos domésticos da atualidade só surgem na Polónia em 200 d.C. Hoje, os gatos domésticos e os gatos selvagens europeus ainda hibridizam, resultando numa ameaça para a saúde genética das espécies selvagens.

Ottoni, que não participou nesta investigação, elogia o estudo por analisar as dietas dos gatos antigos. “Representa um avanço significativo” no nosso conhecimento da evolução dos gatos domésticos, diz Ottoni.


Rastrear a jornada até ao nosso sofá

Os arqueólogos suspeitam que os gatos selvagens do Oriente Próximo – que são um pouco maiores do que os gatos domésticos modernos, mas quase idênticos na sua forma – escaparam primeiro do deserto para tirarem partido de uma refeição fácil: o rato-doméstico que corria pelas quintas do Crescente Fértil.

Os gatos eram comensais, ou animais que exploram os recursos de outros – como comida armazenada ou lixo – enquanto faziam os possíveis para evitar uma relação de proximidade. “Acredita-se que os lobos e os porcos iniciaram o trajeto de domesticação de forma semelhante”, diz Krajcarz. (Leia como os gatos domésticos se domesticaram a eles próprios.)

As pessoas provavelmente toleravam estes carnívoros peludos e podem ter apreciado o seu trabalho voluntário no controlo da população de roedores, e eventualmente deixaram-nos entrar nas suas casas.

O enterro mais antigo de um gato doméstico de que há conhecimento (uma sepultura com 9.500 anos) foi encontrado em 2004 na ilha de Chipre, a cerca de 70 quilómetros a sul da Turquia continental. Ao lado deste gato de oito meses haviam artefactos decorativos, incluindo conchas e pedras polidas, e os restos de uma pessoa de 30 anos (cujo sexo é desconhecido) – talvez o dono do gato. Como não há gatos selvagens nativos no Chipre, alguns cientistas acreditam que os marinheiros levaram os felinos para a ilha há cerca de 10 mil anos.

Ainda existem muitas questões em torno das alterações genéticas e do estilo de vida que transformaram os gatos selvagens em gatos domésticos. Por exemplo, será que se dispersaram pelo planeta através de navios, ou será que viajaram lentamente a pé de povoação em povoação?

Krajcarz espera que um dia as futuras análises genéticas revelem o trajeto completo dos gatos selvagens, desde o deserto, passando pelos campos agrícolas e acabando no calor dos nossos lares – e corações.

Este artigo foi publicado originalmente em inglês no site nationalgeographic.com.

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